Já nos tínhamos habituado ao ritmo diário de notícias sobre acontecimentos relativos à actuação do governo Sócrates/Cavaco no capítulo da saúde. Ele foi uma "fuga" de informação sobre os "trabalhos" de uma comissão que "estuda" a distribuição geográfica das urgências hospitalares, ele foi uma entrevista do ministro à agência de notícias Lusa, ele foi uma série de declarações ministeriais sobre novas taxas moderadoras a pagar pelos doentes por serviços de saúde que necessitem.
No meio desta algazarra foi publicada a portaria 994/2006 onde são estabelecidos os valores das diárias, a pagar pelos doentes, nas unidades de média duração e reabilitação, 17,35€, e de longa duração e manutenção, 27,34€, ambas integradas em experiência piloto da recém criada Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados. Estes valores,se reportados ao mês, dão as importâncias de 520,5€ e 819,2€, que são bem superiores aos rendimentos mensais de mais de metade dos portugueses. É certo que está prevista uma comparticipação da segurança social dependente dos rendimentos do doente, mas também é certo que os termos dessa comparticipação são remetidos para diploma a aprovar futuramente em data indeterminada, tudo isto apesar de o internamento carecer de autorização prévia do Instituto de Segurança Social, I.P. ou das administrações regionais de saúde mediante fundamentação da unidade prestadora de cuidados, ou seja, o doente não ser internado só por vontade própria, e a portaria se aplicar retroactivamente ao mês passado, obrigando, portanto, os pacientes internados no mês passado a pagar. Temos aqui expressa, neste pequeno exemplo e mais uma vez, a política de saúde do governo. Esta consiste em, manifestamente, pôr ao serviço de uma minoria, que é quem pode pagar o que chamam de "apoio social", a estrutura do SNS, deixando ao abandono a grande massa da população na sua quase totalidade proletária e que é quem suporta em grande parte, com o trabalho e os impostos que paga, essa mesma estrutura do SNS. A táctica é a habitual: diz-se que haverá apoio para os mais carenciados, mas para já aprova-se quanto se paga, que é incomportável para a maioria, e o diploma que define os termos do apoio, que não se sabe ainda quais são, remete-se para as calendas. Ou seja: para já paga quem paga impostos e só tem acesso quem pode pagar do seu bolso cerca de 1,5 a 2,5 salários mínimos por mês, em futuro incerto virão os apoios, se é que alguma vez hão-de vir.
Mas, mesmo assim, o ministro parece arrependido. O que é chamado de "encargos com cuidados de saúde" dos internados, que, pela dita portaria, é totalmente suportado pelo orçamento da saúde, na tal entrevista concedida à Lusa, é dito pelo ministro que poderá passar a ser parcialmente suportado pelos doentes, uma vez que está a ponderar criar taxas moderadoras para os internamentos e para as cirurgias de ambulatório. Segundo ele os objectivos destas novas taxas são "estruturais": moderar o acesso e que os doentes valorizem o serviço prestado, por exemplo. Portanto, como se depreende das palavras do ministro, trata-se de "melhorar" a estrutura de pensamento e, também, do bolso ou, em alternativa, da má saúde dos doentes que em vez de serem tratados passam a não ter entrada nos hospitais. Neste caso o truque consiste em preparar a "opinião pública" para decisão que já está tomada, esperando que esta se desmobilize quando, após ter reagido inicialmente em relação ao vazio que é uma simples "ponderação", as novas taxas venham de facto a ser exigidas. É a habituação, não a discussão, e muito menos uma devida ponderação, o pretendido.
Já o truque das "fugas" de informação, está mais estafado. É habitualmente usado para obter reacções. Depois torna-se mais fácil fabricar, ou encomendar, uns argumentos "técnicos" ou umas explicações que façam parecer mais amenas as consequências. Os pré-argumentos são a demografia, a acessibilidade e a racionalização dos meios. As consequências são o fecho, até Março do ano que vem, das urgências de 14 hospitais, entre os quais 7 na região especial do Porto: Vila do Conde, Fafe (não pertence à re Porto, mas o seu fecho afectará inevitavelmente o Hospital de Guimarães, que pertence), Santo Tirso, S. João da Madeira, Espinho, Ovar e Estarreja. Isto depois de ouvirmos uma prédica, há cerca de um mês, do ministro sobre as virtudes das urgências hospitalares, contra as urgências dos Centros de Saúde (SAP's e outras) que entretanto, sendo esse um dos argumentos (as urgências dos hospitais são melhores), mandou fechar. Assim, por exemplo, os habitantes da Murtosa cujo SAP fechou em Agosto e que agora têm que se deslocar a Estarreja, no futuro, nem sequer a Ovar poderiam recorrer, teriam que se deslocar a Aveiro. Portanto numa primeira fase fecha-se os SAP's com o argumento que as urgências hospitalares são melhores, na fase seguinte quer-se fechar as urgências hospitalares com argumentos geográficos ou outros que a imaginação do ministro e respectivos acessores venham a conceber. Mas não é só de encerramentos que se trata: mais de metade das urgências dos restantes hospitais verão o seu pessoal reduzido à permanência de dois médicos e dois enfermeiros, ou seja vão ficar com a ausência de pessoal que serviu como um dos elementos para argumentar a falta de qualidade dos SAP's. É que as urgências hospitalares passam a estar classificadas em três tipos: polivalente, médico-cirúrgico e básico, sendo este último uma nova "criação" que consiste na redução do pessoal. A distribuição dos hospitais com urgências médico-cirúrgicas seguiria um critério de acessibilidade: qualquer pessoa estaria a menos de 1 hora de distância. Claro, quem tiver carro e se não houver constricções no trânsito. Bem podemos esperar, caso este "estudo"(*) venha a produzir o efeito que o governo pretende, um agravamento no número de óbitos por falta de assistência em tempo, particularmente em quem não possui carro, ou seja, nos mesmos de sempre. Aqui, o preço de diminuir os custos da saúde é pago pelos doentes com vidas e com gastos em combustíveis. Contra-senso, num momento em que a poluição provocada pela queima de combustíveis fósseis é um dos problemas mais graves da humanidade. Como se vê os fins, diminuir o orçamento da saúde, justificam todos os meios. O governo Sócrates/Cavaco tem aqui homem.
ABAIXO O GOVERNO SÓCRATES/CAVACO!
POR UM SNS GERAL E GRATUITO, ACESSÍVEL A TODOS OS TRABALHADORES!
(*) Ontem, dia 2/10, e depois de uns arranjos no argumentário, mas não nos objectivos, foi tornado acessível ao público. Fica aqui a ligação
(anterior)
Claro que a passagem da gestão da segurança social para as mãos dos trabalhadores envolve um conjunto importante de riscos. Não é disso que se quer tratar aqui, todavia, convem referir pelo menos os dois riscos mais importantes: o estado burguês oferecer aos trabalhadores, por essa via, um presente envenenado, entregando-a sem fundos e sem meios para os recolher e é isso que certamente quererá fazer no momento em que não tiver outro remédio senão entregá-la; uma corja de oportunistas assumir, em vez dos trabalhadores, a direcção da gestão e não faltarão oportunistas que quererão fazê-lo. Não será a simples democracia a resolver estes problemas. Só a democracia operária o poderá fazer.
Avancemos.
Às centrais sindicais foi, de início, difícil admitir a existência de um problema de bancarrota, presente ou futura, da segurança social nos moldes em que está organizada. Razões não faltavam para essa dificuldade: dívidas sem fim do patronato, compromissos de transferências do estado não cumpridas, "incentivos ao emprego" usando as verbas ou os direitos da segurança social, pagamento, com dinheiros da segurança social, de planos de formação que, na realidade, não formavam ninguém, apenas enchiam os bolsos dos formadores, a "municipalização" de bens da segurança social sem qualquer pagamento a esta, suporte dos regimes não contributivos, enfim, as razões decorrentes da segurança social ser um cofre sem fundo onde os governos vão buscar verbas quando bem lhes apetece.
Olhemos os quadros das receitas e das despesas realizadas de Janeiro a Junho dos anos de 2005 e 2006 e as respectivas estruturas, construídos com os dados disponíveis na DG do Orçamento. Vários aspectos ressaem:
nas receitas, desde logo, se os valores da "dívida recuperada", tão badalada, estão contidos nos valores apresentados e, estando, em que parcela;
no que respeita às despesas, a informação explícita para o nosso interesse é pouca, nomeadamente a referente às pensões dos trabalhadores independentes e dos membros de órgãos de gestão.
RECEITAS DA SEGURANÇA SOCIAL |
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30-06-2006 |
30-06-2005 |
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milhões € |
% |
milhões € |
% |
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Contribuições e cotizações | 5557,3 | 59,2% | 5211,6 | 62,7% |
Adicional ao IVA | 316,5 | 3,4% | 296,0 | 3,6% |
Transferências correntes - MTSS | 2697,3 | 28,8% | 2253,4 | 27,1% |
Transferências correntes - FSE | 441,9 | 4,7% | 204,5 | 2,5% |
Transferências correntes - Outras | 55,4 | 0,6% | 53,2 | 0,6% |
Outras (Jogos SC Misericordia, etc.) | 312,1 | 3,3% | 299,5 | 3,6% |
9380,5 | 100,0% | 8318,2 | 100,0% | |
Receitas de capital SS (IGFSS) | 18,7 | 12,8 | ||
Receitas da SS (IGFSS) - Total | 9399,2 | 8331,0 |
DESPESAS DA SEGURANÇA SOCIAL |
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|
30-06-2006 |
30-06-2005 |
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milhões € |
% |
milhões € |
% |
|
Pensões - Velhice | 3554,9 | 41,9% | 3267,2 | 41,3% |
Pensões - Invalidez | 592,8 | 7,0% | 587,9 | 7,4% |
Pensões - Sobrevivência | 698,3 | 8,2% | 656,6 | 8,3% |
Subsídio de desemprego | 946,1 | 11,1% | 890,2 | 11,2% |
Subsídio familiar a crianças e jovens | 295,7 | 3,5% | 296,1 | 3,7% |
Subsídio por doença | 242,7 | 2,9% | 245,7 | 3,1% |
Rendimento social de inserção | 169,1 | 2,0% | 138,9 | 1,8% |
Outras prestações |
287,0 |
3,4% | 281,5 | 3,6% |
Acção social | 714,0 | 8,4% | 625,1 | 7,9% |
Acções de formação profissional | 503,6 | 5,9% | 445,1 | 5,6% |
Administração | 179,6 | 2,1% | 188,9 | 2,4% |
Outras (subsíd. divrs., consumív., etc.) | 303,4 | 3,6% | 297,4 | 3,8% |
Total | 8487,1 | 100,0% | 7920,4 | 100,0% |
Despesas de capital SS (IGFSS) | 18,5 | 14,1 | ||
Despesas da SS (IGFSS) - Total | 8505,6 | 7934,5 |
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