À míngua de qualquer justificação para a situação de cada vez maior retrocesso que se vem verificando no país e particularmente no Norte, as habituais eminências pardas do regime sedeadas a Norte, corresponsáveis, pois têm sido governo, por essa mesma situação, com evidência para as inscritas no PS e no PSD, vêm agora relançar o "debate" sobre a regionalização.
Pretendem que sendo eles a decidir "regionalmente" as coisas seriam muito melhores do que sendo eles mesmos a decidir "nacionalmente". Incapazes (?) de perceber que o problema não está no facto de as decisões serem tomadas em Lisboa mas no facto de serem decisões erradas e que está aí a razão dos resultados que se vêem, acham que um euro gasto por eles devido a uma decisão regional seria muito mais bem empregue do que se a decisão fosse nacional (não importando se a decisão é certa ou errada).
Podíamos pensar que a reabertura deste debate seria o resultado da estupidez de uma dúzia de políticos burgueses, mas não, tem uma utilidade política: servir para poder dizer a evidência de que o Norte está mal e, em simultâneo, desresponsabilizar o governo e as políticas prosseguidas: a única pequena falta do governo (que afinal de contas não é realmente do governo mas dos cidadãos do Norte que votaram massivamente contra a regionalização) seria não ter regionalizado ainda.
É uma espécie de transformação de responsabilidades próprias em esperanças dos outros: a pedra filosofal da política. Calculam que os cidadãos só venham a concluir que afinal a regionalização não serve para nada daqui a alguns anos, anos para os quais programam continuar a tomar as mesmas decisões erradas que hoje tomam nacionalmente, mas a nível regional, "mais perto do cidadão" e "conhecendo melhor as realidades locais".
Mas a verdade é que o desenvolvimento só pode ocorrer quando se concentram meios, não quando se dispersam meios. Quando se trata de desenvolvimento, mas também retrocesso, é o centro que pode arrastar as periferias, não o contrário. E a questão é que o centro está podre e já apodreceu todo o país. É preciso excisá-lo. Aí é que se resolverão os problemas. Não num outro local qualquer.
Trata-se do governo, mas trata-se também da capital. Daí o interesse para o Porto e para todo o país do que se passa em Lisboa.
Em consequência transcrevemos texto do camarada Garcia Pereira escrito para o jornal "Semanário" e aí publicado, sobre Lisboa e as eleições intercalares que ocorrerão também em Lisboa, sem deixar de reparar que, em substância, os problemas do Porto são em grande medida os mesmos problemas de Lisboa.
"Constitui já um lugar-comum dizer-se que em Portugal se chegou ao "grau zero" da política, embora nunca daí se retirem quaisquer conclusões ou consequências.
Uma manifestação disso mesmo - que seria por completo hilariante não fora a gravidade do assunto - foi aquilo que sucedeu recentemente com a questão da marcação da data das eleições intercalares para a Câmara de Lisboa.
Todos os partidos actualmente instalados na Praça do Município, do CDS (este com a ligeira variante de uma ligeira dilação de uma semana) ao Bloco de Esquerda, passando pelo PSD, pelo PS e pelo PCP, se puseram de acordo com a marcação de uma data tão próxima para a realização das ditas eleições que, contra a lei, impossibilitava a constituição e registo das coligações e, sobretudo, inviabilizava (e era esse o objectivo fundamental, ou seja, baralhar e voltar a dar rigorosamente as mesmas cartas viciadas) a apresentação de candidaturas de cidadãos, que teriam assim de recolher não apenas 4000 assinaturas como também 4000 certidões de eleitores, em peregrinação pelas diversas Juntas de Freguesia.
Imposto ilegal e ilegitimamente esse propósito – com o compadrio e responsabilidade da própria governadora civil de Lisboa que logo a seguir se mostrou uma fervorosa apoiante de António Costa - o Tribunal Constitucional, na sequência de uma meritória iniciativa de duas candidaturas fora daquele "arco do Poder" (do MPT e de Helena Roseta), chumbou essa ilegítima e inconstitucional tentativa de os partidos sentados à mesa do orçamento municipal se imporem a si próprios como a única alternativa aos cidadãos eleitores. E eis que, perante esta fragorosa derrota, todos os representantes e mandatários de tais partidos acorrem, com o maior desplante e muito sorridentes como convém, a exclamar para as câmaras a sua "enorme satisfação" pela decisão do Tribunal Constitucional, a tal que foi tomada precisamente contra eles!
E tudo isto sem que a uma qualquer alma jornalística ocorresse perguntar como era possível "gostar" tanto de uma decisão que consagrava exactamente o oposto do pretendido, defendido e até aí imposto por tão sorridentes candidaturas...
Entretanto, e já na fase das reuniões com a RTP para a definição do modelo e do número de debates, eis que a candidatura de António Costa se assume como a única que se opõe à realização de um debate com todos os candidatos, tal como impõe o basilar princípio da igualdade de oportunidades e de tratamento de todas as candidaturas. E, uma vez feita essa denúncia, a esmagadora maioria da comunicação social logo fez sobre ela o mais (im) prudente e sepulcral dos silêncios!
Todavia, se há eleições em que importa ouvir e fazer ouvir todas, sem excepção alguma, as correntes de opinião e todas as ideias-projecto são precisamente estas eleições intercalares.
É que, com a responsabilidade de todos os partidos que já passaram pela Câmara (incluindo o PS nos tempos de Jorge Sampaio e de João Soares bem como o PCP - que resistiu quanto pôde à convocação de eleições intercalares - e o BE que já estiveram coligados com o PS, e naturalmente também o PSD e o CDS/PP, juntos ou separados), nos últimos trinta anos Lisboa foi perdendo de forma cada vez mais marcada a sua viabilidade enquanto grande capital europeia, de progresso, de cultura e de bem-estar, que pode e deve ser.
Na verdade, Lisboa perdeu mais de 20 mil habitantes só nos últimos dois anos. Não tem nem cria empregos. Não constitui qualquer pólo de desenvolvimento, seja ele económico, tecnológico, cultural ou social. Perdeu – não obstante as suas óptimas condições naturais e a sua excelente situação geo-estratégica – qualquer competitividade internacional, valendo menos no quadro europeu do que qualquer dos sete principais portos espanhóis. Tem dezenas e dezenas de milhares de pessoas, em particular jovens, a quererem e a precisarem de habitação e tem dezenas e dezenas de milhares de casas prontas, mas fechadas e devolutas, à espera do lucro fácil da especulação imobiliária (que assim tomou conta e distorceu por completo o mercado da habitação e se enleou e se assenhoreou da própria Câmara Municipal).
Ainda que nalgumas zonas (por exemplo em Alfama) haja alguma recuperação em curso, ela é demasiado lenta e demasiado exígua, Lisboa é hoje uma cidade envelhecida e degradada, feia, inexplicavelmente desleixada (como sucede com os jardins municipais) e muito, muito suja; por inteiro desertificada a partir do fim da tarde em certas zonas (como as Avenidas Novas e a Baixa); onde a imagem da complacência perante a ilegalidade e o abuso está continuamente presente (as obras, como, por exemplo, as do Metro na Av. Duque d'Ávila e no Terreiro do Paço, arrastam-se interminavelmente e sem fim à vista; o espaço público é todos os dias abusiva e gratuitamente ocupado por toda a sorte de prevaricadores; as cargas e descargas fazem-se impunemente em qualquer local e a qualquer hora o dia ou da noite; o estacionamento ilegal é sistematicamente tolerado em certas zonas, fazendo com que avenidas com três faixas de rodagem disponham apenas de duas ou até de apenas uma).
Lisboa e todos quantos nela vivem ou trabalham ou a visitem estão laqueados e separados do Tejo por uma instituição feudal sem rei nem roque (a Administração do Porto de Lisboa), que é dona da margem norte do rio praticamente de Vila Franca de Xira até Cascais e a quem a cidade continua a tolerar que pratique inefáveis desmandos como o dos autênticos caixotes que estão a ser construídos mesmo ao lado do Cais do Sodré.
Lisboa é, pois, hoje um local onde se não pode gostar de viver e/ou trabalhar, porque não tem qualidade de vida, o trânsito automóvel e a poluição sonora são um autêntico inferno, os transportes públicos (cuja administração nunca deveria ter saído das mãos da Câmara) não servem as necessidades da população, onde tudo foi sacrificado ao automóvel e onde não há espaços de cultura, de lazer e de bem-estar, onde as pessoas possam simplesmente estar, viver, respirar e gozar as delícias de uma cidade pulsante de vida, de fervilhar económico, de trabalho, de oferta de cultura, de desporto.
A própria Administração autárquica é o reflexo de toda esta política de abandono, de traição aos interesses dos lisboetas e do país e de enleio com os grandes e poderosos interesses instalados. A Câmara de Lisboa tem, pelo menos, o dobro dos funcionários e colaboradores que deveria ter (tem 10 mil para cerca de 600 mil habitantes enquanto, por exemplo, Madrid tem 25 mil funcionários para mais de três milhões de habitantes) decorrentes, em larga medida, da acumulação nas suas prateleiras das sucessivas clientelas partidárias, até se chegar àquela que aplaude o Eng.º Carmona Rodrigues... e consome mais de 90% dos seus recursos a pagar vencimentos e remunerações!? Todos conhecemos a imensa teia burocrática que cerca e asfixia a autarquia e os fenómenos de corrupção (política, económica, social ou outra) a que ela necessariamente está ligada - e o tempo que um simples processo de obras que não teve a chancela "certa" leva a despachar ou a admissibilidade de escândalos urbanísticos como a do caixotão construído à entrada do Bairro Alto pelo lado do Largo do Calhariz são disso meros exemplos.
E se aqui se chegou foi por responsabilidade de todos quantos governaram a Câmara desde o 25 de Abril para cá, pelo que não é seguramente nas tais forças políticas que já lá estiveram e governaram que se encontrará a linha de orientação e a firmeza necessárias para a resolução de todos estes problemas.
Ao invés, essa linha de orientação tem, antes de tudo, de ser de completa ruptura com este estado de coisas, a todos os níveis e em todos os aspectos.
Portugal e, nesta época da chamada "globalização", a Europa precisam para o seu próprio desenvolvimento de uma grande capital que seja a sua porta de entrada (e também de saída para tais destinos) de pessoas e de mercadorias vindas da América do Norte, Central, e do Sul, de África (em particular das ex-colónias) e até do Mediterrâneo, que crie e desenvolva emprego.
É por isso que a questão de Lisboa não é meramente uma questão dos lisboetas, mas sim uma questão do País (e também, como referi, da própria Europa), que a têm de pagar e suportar.
Ora Lisboa, para desempenhar esse papel vital de motor de desenvolvimento do País, precisa de três grandes desenvolvimentos estratégicos, de três grandes infra-estruturas: um grande porto internacional (que é susceptível de criar cerca de 20 mil empregos e que nada tem que ver com o "apeadeiro fluvial" que é actualmente o Porto de Lisboa); um grande aeroporto internacional de futuro (que é susceptível de criar cerca de 30 mil empregos e que tem de ter as melhores condições de operação e a máxima capacidade de expansão, e que não pode ser, desde logo por razões políticas, situado na Ota, porque essa localização é um desastre para a viabilização de Lisboa como grande capital europeia) e de um grande trem de ligação rápida à Europa, até para que o Porto e o Aeroporto de Lisboa possam ter viabilidade.
A Câmara deve passar a ter de novo a direcção da política dos transportes públicos na cidade, voltando a integrar a administração das respectivas empresas. Deve atacar corajosamente a especulação imobiliária e o problema da habitação, impondo aos proprietários de casas devolutas um prazo curto para as venderem ou arrendarem e, caso não o façam, deve tratar de as expropriar e ocupar tais casas com pessoas que precisam dessa habitação.
Deve atacar, e atacar em força, os interesses instalados que tomam conta da cidade - deve assim fixar prazos máximos para a conclusão de obras como as do Metro, cobrar taxas pela ocupação com tais obras dos espaços públicos, deve pôr a Polícia Municipal a rebocar imediatamente todos os automóveis estacionados em segunda fila ou a impedir ou prejudicar o trânsito dos peões.
A Câmara de Lisboa, com o seu presidente à cabeça, deve extinguir todas as actuais empresas municipais (que apenas servem para criar tachos e fugir ao controlo das despesas públicas) e colocar os respectivos sectores de actividade sob a égide directa dos vereadores.
A Câmara de Lisboa, com o seu presidente à cabeça, deve bater-se por decidir tudo e mandar em tudo o que diga respeito à cidade, lutando pelo fim do reinado da administração do Porto de Lisboa, que, no mínimo, tem de ficar sob a tutela e as ordens do município e, no máximo, ser extinta!
Estas são, creio, as ideias que podem e devem ser o mais amplamente discutidas, debatidas e desenvolvidas. Por mim, estou disposto a fazê-lo com tudo e com todos.
Sim, é que Lisboa já está a arder (de incompetência, de compadrio, de desleixo, de falta de visão estratégica)!...
Mas é possível, e é preciso, tomar medidas, e medidas drásticas, para a salvar do desastre!"
por Garcia Pereira
2007-06-06 22:30
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